“Sei que significa muito pras pessoas que me acompanham também, pros artistas que nos olham como referência, a gente sente a vibração de quem torce por nós”, declarou André Prando sobre sua participação no palco SUPERNOVA do Rock in Rio

FOTO: FELIPE AMARELO

Com videoclipe novo na praça, o cantor e compositor capixaba André Prando alcança um dos maiores palcos do mundo: O Rock in Rio. Na edição deste ano, no Rio de Janeiro, o artista sobe ao palco SUPERNOVA no dia 6 de outubro. Nesse mesmo dia, o festival também receberá artistas como Muse, Os Paralamas do Sucesso e o encontro entre Lulu Santos e Silva.

Em entrevista ao portal MBV, Prando contou suas referências para a realização do clipe da canção “Fantasmas Talvez” e garante que tem muito material de seu último álbum – Voador -, que será a essência de seu show no próximo dia 6:

“Ainda considero “Voador” novinho, pretendo circular muito com ele ainda (ficamos em turnê com o Estranho Sutil, disco anterior, por 3 anos). Temos o show Voador captado em vídeo e vamos trabalhar esse lançamento ainda, registros acústicos e outros videoclipes”. 

 

Música Brasileira Viva: André, recentemente você foi anunciado como uma das atrações do palco SUPERNOVA, do Rock in Rio 2019. É a realização de um sonho? Como isso impacta na sua carreira? 

André Prando: Talvez seja o show mais especial da minha vida, é o sonho de qualquer artista, a gente trabalha pra alcançar cada vez palcos maiores, mas esse convite foi inesperado. Claro, sei que é fruto de muitos anos de dedicação. Sei que significa muito pras pessoas que me acompanham também, pros artistas que nos olham como referência, a gente sente a vibração de quem torce por nós. Energia é coisa séria, né? Alegria define! Acredito que vai marcar nossa história, mas o corre continua o mesmo, sabe? Se as pessoas passarem a se atentar mais pra nós por conta disso, massa! Acho ótimo (risos)

 

MBV: Em seu novo clipe, da canção “Fantasmas Talvez”, você mescla uma série de referências – musicais, cinematográficas e plásticas. Musicalmente, você homenageia artistas da sua cidade natal, Vitória. Há outras referências da música nacional também? Quem mais te influencia?

AP: Músicas como “Na hora do almoço” (Belchior) e “Panis at circense” (Caetano Veloso e Gilberto Gil) foram inspiração pra criar a cena da família na mesa, outras referências cinematográficas foram Magnólia (1999), Ghost Story (2017), além da estética inspiradora de Jodorowsky e David Lynch. São sempe muitas inspirações e suor de ideias pra construir roteiros complexos e músicas que colocam as pessoas pra viajar. Alguns nomes que me inspiram? Além dos já citados, Sérgio Sampaio, Raul Seixas, Alceu Valença, Chico Cesar, Mutantes, John Frusciante, Doors, Beatles, tanta coisa…

Trecho do clipe “Fantasmas Talvez”, de André Prando. FOTO: Gabriel Hand

 

MBV: Depois do sucesso do disco “Voador”, lançado no ano passado, você já tem algum novo projeto em mente?

AP: Ainda considero “Voador” novinho, pretendo circular muito com ele ainda (ficamos em turnê com o Estranho Sutil, disco anterior, por 3 anos). Temos o show Voador captado em vídeo e vamos trabalhar esse lançamento ainda, registros acústicos, outros videoclipes, etc. Paralelo à isso, algumas parcericas com outros artistas em andamento e algumas ideias para disco futuro, mas o foco ainda é explorar o universo Voador bastante.

 

MBV: Como você vê hoje o governo Bolsonaro? 

AP: Simplesmente um pesadelo. É muito triste que estejamos tendo que passar por isso, que as pessoas tenham sido enganadas por um discurso tão raso da tal “mudança”, que tenham se contentado com uma opção tão despreparada como Bolsonaro. A onda do discurso de ódio, de fugir de debates, de autoritarismo, é simplesmente inacreditável. Espero que o povo acorde logo. Como artista, eu espero estar fazendo minha parte de inspirar o pensamento crítico e a reação das pessoas. Como canto no Voador: “A maré vai mudar, amar e mudar. Todas essas coisas eu vi num transe” (Eu vi num transe)

 

Por: João Santiago

EDITORIAL: Os critérios do portal MBV para a escolha das listas musicais do homenageado de cada mês

No mês de setembro, a homenageada do portal Música Brasileira Viva é a cantora e compositora Marisa Monte. Para deixar tudo transparente pra você, leitor, vamos explicar os CRITÉRIOS para a escolha das canções referentes aos artistas homenageados:
– Optamos por costurar uma história em todas as nossas seleções musicais dedicadas ao artista homenageado de cada mês. Desse modo, ouvir as canções na ordem da lista faz muito sentido;
– O intuito é pinçar obras de cada fase da carreira do músico ou da musicista em questão;
– Entendemos que toda lista é subjetiva, portanto estamos sempre abertos a sugestões.

Por: João Santiago

 

Mandu na série ENCONTROS MBV: ‘Eu acho que a gente vai chegar a um ponto em que a música brasileira vai ter um destaque global, verdadeiramente global’.

Abrindo a série ENCONTROS MBV, entrevistamos o cantor e compositor Mandu. O artista, que antes era conhecido com seu nome próprio, Anderson Almeida, hoje vive entre a cidade de Volta Redonda – sua terra natal – e o Rio de Janeiro. Recentemente lançou a canção Me Julgue junto com videoclipe dirigido e roteirizado por ele mesmo. Apesar de ter composto a canção há quatro anos, Mandu preferiu deixá-la maturando a espera do momento certo. E o momento chegou. Com uma sonoridade ímpar, repleta de referências (diretas e indiretas) que vão desde Bob Dylan a Cazuza, o cantor chega com a competência e o frescor de um som novo e conciliador em um país dividido.  ‘O pessoal tá achando que o diálogo é opcional. E eu acho que não é não’, afirmou o artista que pretende, com a sua música, unir mais as pessoas.

Mandu falou de suas inspirações musicais no finalzinho da entrevista, mas no dia seguinte entrou em contato conosco para lembrar de duas grandes referências não citadas: Paulinho da Viola e o Clube da Esquina. Você pode conferir o relato dele no vídeo abaixo no MBVTV e, em sequência, a entrevista completa.

 

Música Brasileira Viva: Mandu, a música que você faz te empodera? Em que medida?

Mandu: Acredito que sim, me empodera, mas quando eu permito que ela me empodere. Eu acho que eu consigo por meio da minha música acessar lugares da minha vida e da minha cabeça, que fazem com que eu me sinta realmente empoderado. Mas eu preciso permitir isso. E quando eu digo permitir, às vezes não é muito consciente. Tem dia que eu falo: ‘pô, tenho que me libertar um pouco’. Às vezes eu tô muito preocupado com a guitarra, em como a guitarra tá soando, como a banda tá soando. Por conta de eu ser artista solo e não ter nenhum produtor musical, acaba que eu sou responsável por coordenar a banda também. Por mais que eu confie nos meus músicos, a gente ainda tá numa fase (porque eu comecei a ensaiar com uma galera nova) em que eu tenho que prestar muita atenção em muitas coisas. Então acaba que o meu empoderamento por meio da música fica, nesse momento, um pouco comprometido porque eu faço um papel que não é só de me soltar. Mas é culpa minha, não tô dizendo que é bom isso não.

MBV: Mas por quê você considera que é culpa sua?

M: É porque eu sou muito preocupado com a qualidade do negócio. Com o groove, com muita nota… Eu odeio coisa muito complexa desnecessariamente. Eu acho que tem coisas que tem que ser complexas, mas a minha música não pode ser, senão ela perde um pouco do sentido. Eu fico prestando muita atenção pra ver se o batera tá fazendo coisas demais, se ele está focado na parte dele e esquecendo que ele tá tocando com o todo. É por causa disso. Eu me incomodo muito com excessos ou com a falta de alguma coisa. Isso que me limita um pouquinho, mas eu tô melhorando nesse aspecto, tô ficando mais relaxado. 

MBV: Recentemente você lançou a canção e o clipe da música ‘Me Julgue’. Antes, você assinava os trabalhos como Anderson Almeida, que é o seu nome mesmo. O que o levou a mudar essa trajetória? Como foi esse processo?

M: Foi um processo legal, tá sendo ainda. ‘Mandu’ eu espero que continue pra sempre em construção. É muito clichê falar isso, mas é verdade. Eu trabalhava com mercado, né?

Eu sou administrador e trabalhava com mercado financeiro e sempre gostei. Nunca foi tipo aquela frustração por não ser músico. Mas de uns tempos pra cá, não sei porque, a música voltou a falar muito comigo e aí, ser Anderson Almeida naquele momento fazia muito sentido porque eu acho o meu nome até relativamente sonoro, não me incomodava isso, por mais que ele fosse um pouco sério. Tem até um amigo meu, o Mike, de uma banda muito legal chamada Outroeu e ele falava pra mim: ‘pô, cara. Anderson Almeida dos Teclados?’.

Uma coisa meio cafona… Não que isso seja necessariamente ruim, mas pro tipo de música que eu faço não cola. E aí os anos foram passando e eu fui de pouco em pouco sendo convencido subconscientemente, mas uma semana antes de eu falar que eu era Mandu, eu falei pra ele no telefone. Ele falou pela milésima vez: ‘cara, você tem que ser Mandu. Mandu é legal’. E eu falei pra ele: ‘cara, pode ser que eu mude pra Mando, Mandinho’ – porque meu apelido mesmo é Mando – ‘mas Mandu eu te garanto que não vai ser’. Uma semana depois eu tive meio que uma micro epifania e minha cabeça falou pra mim: ‘cara, você é Mandu’, aí foi isso.

MBV: Mas foi essa epifania mesmo vinda desse apelido então?

M: É, foi um apelido. Porque assim, o meu nome é Anderson e na família do meu pai o pessoal me chama de ‘Andinho’. E aí há uns 10 anos, eu comecei a ficar amigo de um rapaz que era namorado de uma prima minha, da família do meu pai. Aí ele começou a me chamar de ‘Mandinho’, porque ele achava que o meu apelido era esse e não ‘Andinho’. E aí muita gente hoje em dia me chama de ‘Mando’, aí pegou daí. E o ‘Mandu’ é uma variação disso e quem inventou foi o Mike mesmo. Aí algumas pessoas começaram a me chamar de ‘Mandu’, de brincadeira, e aí um belo dia eu fui convencido por isso, sei lá, é muito estranho. Eu não sei nem explicar muito como eu fui convencido. Eu acredito que a vida vai muito além daqui, né? E, assim, pra mim não era só a minha cabeça que tava falando comigo, eu me senti, não digo obrigado, mas profundamente orientado a aceitar aquilo. É uma tentativa de eu me aproximar mais das pessoas, eu acho esse nome mais curtinho. Eu acho que é mais fácil as pessoas se verem no Mandu que no Anderson Almeida. É um pouco mais brasileiro. Por mais que Anderson seja um nome muito usado e Almeida seja um sobrenome português, o ‘Mandu’ é mais brasileirão. Ele é menos português e mais brasileiro. E outro motivo pelo qual eu usava Anderson Almeida e agora eu não uso mais é porque eu morava nos Estados Unidos. Lá ‘Anderson Almeida’ é um negócio meio exótico, meio diferente, intrigante. 

MBV: E sobre o clipe de ‘Me Julgue’? Como foi o processo de criação? Começou já há bastante tempo?

M: Já. Já tem mais de um ano. Essa música é antiga já, já tem quatro anos. Então eu ainda era Anderson Almeida quando eu fiz (risos). 

MBV: Mas você não chegou a lançar antes?

M: Não, não lancei antes não. Eu deixei ela pra depois, até porque as músicas que eu lancei como Anderson Almeida eram um pouco mais pop. Eu fiz essa música mais ou menos na mesma época que outras, como Disfarce, Estive Atento, que é uma música minha que vai sair em breve, e que eu tinha uma versão antes em inglês que se chama Trust the Tide. Fiz mais ou menos na mesma época e todas estão em ‘Anderson Almeida’, só ‘Me Julgue’ que não tá. Mas eu fiz na mesma época também. Quando eu tava morando nos Estados Unidos, eu era amigo de uma galera foda. Eles tocavam bem e eu queria, inclusive, gravar um disco com todos eles um dia. Mas eu gravei ‘Disfarce’, que foi a primeira música que eu lancei, com essa galera e depois, uma galera muito parecida, quase o mesmos músicos, a base da banda, eu gravei com eles também ‘Me Julgue’. A música já tá gravada desde 2016, uma parte dela. Aí depois eu vim pro Brasil passar férias, uma banda lá de Volta Redonda chamada Amplexos, que é muito, muito foda, e ela tem o Matché e o Tolentino. O Tolen é percussionista e o Martché é o tecladista. Os dois são gênios. E gênios humildes, simples e pessoas muito legais. E eles toparam fazer tanto Me Julgue quanto Disfarce comigo. Eles gravaram os teclados e a percussão. E aí os teclados, a bateria e o baixo da canção já estão gravados desde 2017. Só que o tempo foi passando, ela ficando ali – não que eu tivesse desistido de lançar, não foi isso não -, mas ela tava lá porque eu tava fazendo um trabalho mais pop e pensei em fazer isso depois. Eu não ligo muito de ser pop ou não o som, desde que seja legal.

O clipe de ‘Me Julgue’ chegou no ano passado. Eu me reuni com o Lucas e com o Júlio e falei: ‘cara, eu quero fazer um clipe’. Mas aí o Júlio que foi diretor de fotografia, ele ia fazer a direção, o roteiro e tal. Só que aí, no final das contas, eu comecei a criar a história na minha cabeça e eu mesmo que fiz a direção e o roteiro. E o Júlio filmou, obviamente, fez a direção de fotografia, escolheu as lentes, essas coisas que eu não sei nada. E o Lucas fez a produção. Mas a gente começou a conversar a respeito disso em maio do ano passado (2018) e aí no final do ano a gente começou a gravar.

Aí eu gravei oito dias e depois eu fiquei, sei lá… Cara, que experiência louca. Porque eu fiquei editando… Os meninos também editaram, mas assim…Eu tinha comprado um computador novo que me ajudou pra cacete porque não ficava travando. Aí eu fiquei uns 10, 11 dias editando. Foi uma maratona. Eu não sabia editar e eu tive meio que reconstruir o roteiro na edição porque muita coisa ficou diferente. Eu fui parcialmente dirigido pelo clipe. Eu te afirmo isso com tranquilidade. Boa parte daquilo que tá ali, o clipe foi meio que se resolvendo à medida em que eu fui trabalhando. Eu senti que o universo tava meio que me dando algumas coisas, tipo assim ‘ah, cara. Você não sabe fazer isso aqui direito, mas a gente vai te ajudar’. Eu senti um pouco disso.

MBV: E o resultado todo mundo viu já, né? Ficou muito bom

M: É, eu gostei muito. Fiquei muito feliz. É difícil às vezes falar, né? Porque parece que a gente tá se achando o fodão e eu odeio isso. Mas eu também gostei muito. Fiquei feliz pra caramba. 

 

MBV: Você tava falando de uma música em inglês que você lançou e que vai fazer uma versão dela em português. Mas por que você fez uma música que mesclasse o português com o inglês? 

M: Eu morei nos Estados Unidos, pela segunda vez, no começo de 2016 e a metade de 2018. Eu fiz uma pós-graduação e fui gravar as músicas também. Primeiro eu gravei ‘Disfarce’ e ‘Me Julgue’ com o pessoal que ficou lá e aí meu pai viu que eu tava muito ligado nas coisas de músicas, virou pra mim e disse: ‘meu filho, por que você não faz um negócio com uma qualidade muito boa? eu te ajudo’. Aí eu conheci um produtor de Los Angeles, falei com o cara e mandei as canções pra ele. Tinha Gently, que é toda em inglês, Tudo o que eu te digo, que é toda em português, e Trust the Tide, que é parte em inglês e parte em português. Eu fiz isso na época porque eu tava realmente morando nos Estados Unidos. E as pessoas de lá gostavam muito de me ver cantando em português, mas elas preferiam me ouvir cantando em inglês.

Quando eu era pequenininho, eu tinha parte da família que morava nos Estados Unidos e eu ia visitá-los. Eu não sabia falar inglês quando eu era pequeno, só quando fiquei mais velho, mas meu subconsciente parece que gravou muito da pronúncia. Quando eu canto em inglês as pessoas não reparam muito que eu sou brasileiro, sabe? Eu quis usar aquilo a meu favor. Achei melhor gravar, parcialmente pelo menos, em inglês, sem querer enfiar o português goela abaixo da galera. Acabou que não deu muito certo em termos comerciais. Eu acabei voltando pro Brasil e a propaganda que eu fiz, tudo, os shows foram feitos aqui como Anderson Almeida. Não foram feitos lá porque eu voltei a morar aqui. Se eu tivesse focado mesmo nos Estados Unidos, talvez tivesse me rendido um pouco mais de fruto. Mas eu acho que isso é algo que eu tenho que pensar pra daqui a muito tempo. Eu gosto e acho importantíssimo estar no Brasil agora. Acho que a gente precisa muito se unir. E eu acho que a música pode me ajudar a conseguir me unir com pessoas que, talvez, se eu não estivesse aqui, eu não fosse conseguir. 

MBV: Você acha que esse momento mereceria essa união? Precisaria dessa união?

M: Precisa. Eu evito falar dessas coisas, mas… Tá todo mundo brigando e isso me deixa muito chateado. E eu tenho amigos de tudo quanto é crença que você pode imaginar. Tanto no Brasil quanto fora. Mas eu digo mais no Brasil mesmo, eu tenho hoje em dia amigos que deixaram de falar uns com os outros por causa de política. E eu conheço todo mundo muito bem, não são colegas, são realmente amigos. E isso me chateia profundamente. Eu queria poder usar um pouco do talento que eu venho lapidando, um pouco das emoções que eu sinto e da minha personalidade acima de tudo, porque eu sou uma pessoa que pensa muito assim. Eu não gosto de ver as pessoas brigadas… Canceriano é foda, né? Eu não gosto de ficar brigado com ninguém, ninguém. Se eu fico brigado com alguém eu não consigo nem dormir direito.

Quero tentar usar um pouco da minha profissão para ajudar a minha vida um pouquinho e talvez os meus amigos e, se um dia eu ficar famoso, as pessoas se sentirem conectadas por meio daquilo. Eu acho que música tem que ir muito além dessas brigas. Eu não consigo ir ainda. Eu acho que minhas músicas são despolitizadas, mas isso não quer dizer que elas estejam acima das músicas políticas. Eu acho que não. Eu acho que ainda tenho um longo caminho pra trilhar, pra conseguir fazer as coisas que eu quero. Mas eu não pretendo falar de política. Eu não me vejo falando disso. E não tem nada a ver com questão comercial porque eu acho que tem muito público de esquerda e tem muito público de direita. Acho que tem gente pra consumir música política de qualquer jeito. Não tem a ver com isso. Tem a ver com o fato de que eu prefiro estar no meio do caminho sempre. O caminho do meio é o que menos me assusta. Não tô dizendo que ele não é assustador. 

MBV: O seu lado pessoal, nesse sentido, influencia a sua arte?

M: Não, influencia a minha arte, mas eu tenho opiniões. Não tô dizendo que não tenho opiniões políticas, eu tenho muitas. 

MBV: Aproveitando isso que você está falando, qual a sua perspectiva sobre o governo Bolsonaro?

M: Eu acho muito ruim, eu acho muito ruim. Acho que poderia ser pior, mas eu acho muito ruim. É muito difícil eu falar pra você  que eu gosto de alguma coisa, de algum governo. Mas eu acho o governo atual ruim. O que, do meu ponto de vista, não anula a necessidade de diálogo e eu acho que essa é a minha maior preocupação. Por isso que eu não gosto de falar de política nas músicas. Eu sinto que o pessoal ainda não tá preparado pra ver um músico falando que é necessário o diálogo.

As pessoas estão querendo ver as outras falando de ataque. Eu poderia atacar o governo de várias formas – eu acabei de falar que acho o governo muito ruim -, mas eu não acho que isso seja necessariamente igual à eficácia. Ser combativo é, claro, necessário. Eu acho que tem gente que nasceu até pra fazer isso mesmo, mas o pessoal tá achando que o diálogo é opcional. E eu acho que não é não.

Por isso que a gente conseguiu em outros governos ter boas conquistas, né? Na década de 90, 2000 a gente teve muitas conquistas por conta de diálogo. Foi um diálogo complicado… Eu não vou entrar nesses detalhes porque a gente já sabe como é que banda toca. Mas é inegável que o diálogo teve um papel importantíssimo e hoje em dia não acho que esteja havendo muito. Eu sou 100% a favor do diálogo, mesmo que seja pra você falar que o cara tá completamente errado. Mas você precisa explicar pra ele o porquê você acha que ele tá errado e ele precisa explicar pra você porque que ele acha que você tá errado. Se isso não acontecer, bicho, eu acho que a gente não vai mesmo sair do lugar. A gente vai ficar empacado enquanto nação, enquanto a gente não for mais humilde. Eu digo eu também. Porque eu não sei ouvir direito, sabe? 

MBV: Olhando de certa forma para esse cenário também, pra você quais são as maiores dificuldades e facilidades de fazer música independente no Brasil?

M: É difícil pra cacete. É até difícil olhar para as facilidades. Eu digo isso porque eu tenho o apoio da minha família e, assim, meu pai não é músico, minha mãe não é musicista, minha irmã também não. Minha família não tem música, eu sou o único. Mas eu tenho apoio. Inclusive, se eu estiver passando aperto financeiro, sei que meus pais vão me dar uma ajuda. E sou profundamente grato por isso. E mesmo assim é difícil pra mim. Tive oportunidade de estudar num bom colégio, fiz faculdade e tal, e ainda é difícil pra caramba. E agora por que? Porque você tem que ir contra o senso comum. As pessoas não entendem e, inclusive, músicos não entendem que ser músico é trabalho, é uma profissão.

O pessoal às vezes tem dificuldade de olhar dessa forma porque tá todo mundo se divertindo quando tá ouvindo música e aí acaba se esquecendo do que tá acontecendo por trás. Fazer música é um processo profundamente complexo, se você for fazer muito bem feito. E mesmo se não for muito bem feito, é difícil mesmo. Eu acho que tem a ver com isso, você ir contra conceitos que te levam a crer que música é uma parada meio… ‘ah, você é muito doido, né? Você é músico’.

É difícil você se enxergar como um verdadeiro profissional e as pessoas que conseguem se enxergar dessa forma rompem uma barreira que elimina uma parte – não digo a maior a parte das dificuldades-, mas uma dificuldade que é muito grande. Outra coisa tem a ver com o preço das paradas. Preço de tudo. Se você quer comprar uma boa guitarra, das duas uma: ou você tem muita grana, ou você trabalha igual um condenado para conseguir comprar uma boa guitarra. Não tô dizendo uma guitarra excelente, tô dizendo uma guitarra que você consiga tocar e que ela consiga entregar uma parte daquilo que você quer mostrar. É lógico que hoje em dia com o Mercado Livre, essas coisas, você consegue comprar, às vezes, um instrumento com um preço legal. Mas é muito difícil ainda. Eu acho que o preço das coisas é muito complicado. E outra parada tem a ver com cultura também… Você tem várias coisas, né? Falta de lugar pra tocar, que é uma merda, mas tem uma outra parada que eu acho que prejudica um pouco a música nacional como um todo. Músico, de maneira geral, era pra ser muito cabeça aberta, mas nem sempre é. As pessoas são meio cabeça fechada. Tem muita gente presa dentro de um conceito que não faz o menor sentido, do tipo ‘ah, eu só posso tocar isso’ ou ‘você só pode fazer isso’. Tem gente que não aceita o fato de ter um artista brasileiro que vá cantar um disco inteiro em inglês, por exemplo. Como assim? Por que não? Se ele quiser, qual o problema? Ele não deixa de ser músico brasileiro por causa disso. E tem gente que acha também que música nacional é ruim. Tem uns músicos que acham que música nacional é ruim, só porque a qualidade da gravação, das antigas principalmente, não é boa. Eu acho que as pessoas estão muito cabeça fechada, sabe? Isso prejudica pra cacete. É muito difícil você fazer música e ter a cabeça aberta porque a maioria dos artistas ainda tem a cabeça fechada. Eu não tô falando mal dos meus colegas não porque eu também sou cabeça fechada. Mas a gente precisa se abrir mais. Tem também uma questão cultural, que eu acho que não tem a ver com o fato de ser músico, mas da dificuldade de produzir conteúdo de qualidade. Como as coisas são muito caras, a gente não tem uma cultura de engenharia de som, de mixagem, de master. As pessoas não sabem fazer uma boa gravação. Você vê, por exemplo, meus amigos gringos são todos de classe média pra classe média baixa, sempre tiveram uma vida, pro padrão americano, corrida pra caramba, mas eles sacam muito de engenharia de som. Lá você vai em uma loja e consegue comprar a parada. Você tem um equipamento que é razoável pra ruim, mas você sabe cada detalhinho dele. E aqui no Brasil, infelizmente, não é assim. Se você for numa comunidade, mesmo no Cantagalo, que pra uma comunidade carente é um lugar tranquilo, onde boa parte das pessoas tem dinheiro pra comer, boa parte das crianças frequentam a escola, um lugar light, digamos assim, pro padrão que o Rio de Janeiro tem de problema… Eu trabalhava numa ONG lá que, pra galera conseguir um equipamento básico do básico era uma dificuldade enorme e isso me deixa muito chateado. Porque você vê o nível de talento das crianças, você vê o nível de aptidão das crianças pra fazer as coisas e, pra você desenvolver sua disciplina como músico, tá muito aliado a você ter condições básicas de fazer aquilo. Se aquilo não é prazeroso e você não tem o mínimo de apoio, se torna muito difícil porque você vai ter conflitos na sua vida com as pessoas e consigo mesmo por conta de ter feito aquela escolha. E isso tá ligado a você ter pelo menos o basiquinho. Tipo banda de garagem. É uma parada que não existe, cara. É foda. Eu toquei com uma banda e a galera tinha ensaio de um dia inteiro. Ligam o equipamento e ficam lá improvisando o dia inteiro. As músicas vão surgindo com muito mais naturalidade. A gente tá aprendendo a fazer as coisas da nossa forma.

Eu sou muito otimista, eu acho que a gente vai chegar a um ponto em que a música brasileira vai ter um destaque global, verdadeiramente global. Acho que a música brasileira vai ser A música um dia. 

MBV: E você acha que as plataformas de streaming podem contribuir pra isso?

M: Pra caralho, pra caralho! Eu acho essencial. Streaming eu acho uma das maiores dádivas do século 21. É uma parada importantíssima pros artistas hoje em dia. E eu fico puto pra caralho quando eu ouço alguma pessoa falar assim: ‘ah, o problema é que hoje em dia todo mundo pode lançar na internet, né?’. Eu falo assim: ‘brother, o que é que você tá falando? Cala a boca’. Tem que ser o contrário, tem que ser o máximo de pessoas possível lançando. Tem que ser massivo o lançamento e tem que lançar cada vez mais. O artista, individualmente, tem que lançar o máximo de coisas possível e perder a vergonha, abrir a cabeça. 

MBV: E quais são os artistas que mais te influenciam hoje?

M: Eu divido em duas paradas: os que aparecem no meu som e os que não aparecem. Os que aparecem – e eu tento até usar um pouco o público como termômetro,até porque é difícil pra mim como artista ver o que está aparecendo – acho que tem um pouco de Arctic Monkeys, em Me Julgue especificamente. Um pouco de Black Keys também. Por mais que eu não ouça muito, acho que tem um pouquinho. Tem um pouquinho de Santana, olhando mais pra trás, porque tem um clima meio latino e tal, e até agradeço ao Tolen (percussionista da banda Amplexos), que enxergou e implementou isso de uma forma muito legal. Os teclados têm uma mistura de anos 60 e 70 com uma parada um pouco oitentista. As cordas e os sintetizadores meio oitentistas. Aí tem também rock Brasil, tipo Cazuza. Você enxerga Cazuza ali? Tem muita gente que enxerga.

MBV: Eu enxergo. 

M: Principalmente ao vivo. No ao vivo eu me animo um pouco mais, eu toco com trio, não tem teclado nem percussão, então a gente soca um pouco mais a mão e eu fico um pouco mais rock and roll. Acho que tem um pouco de rock Brasil, mas o Cazuza é o que mais transparece. E os singles que vão vir em breve já lembra Lulu Santos um pouquinho, tem gente que fala um pouco de Rita Lee, Leo Jaime… 

MBV: Você bebe muito dessa fonte do rock 80, né? Nacional e internacional também. 

M: Eu bebo, mas vão ter outras coisas que não vão beber tanto. É até difícil achar uma coesão nesse meio todo. Porque não adianta só você fazer uma música que seja minimamente legal porque eu acho que ainda tô longe do excelente ainda. Eu acho que o fato de eu estar no meio e a minha personalidade não é tão forte já ajuda a ter uma certa coesão. Mas eu sinto falta de algumas amarras ali que eu tô procurando, alguns nós que eu preciso dar para que o negócio realmente pareça um conjunto que se comunica e não só ‘ah, esse cara é muito doido, ele faz isso, faz aquilo e nada tem a ver’. Eu quero que tenha a ver, né? Das influências que não transparecem…

Eu sou completamente fanático pelo Bob Dylan. Sou muito fã. Algumas coisas vão começar a transparecer um pouco mais em algumas coisas que eu tô fazendo, eu gosto muito da Legião Urbana, sempre gostei. Desde os 10 anos de idade que eu ouço muito Legião. Eu ouvi muito Novos Baianos, muito mesmo. Eu era viciado nos Novos Baianos, ouvia o dia inteiro.

Djavan eu gosto muito, tanto a parte oitentista mais cafoninha, eu acho lindo aquilo quanto a parte mais tradição mesmo, também gosto pra cacete. O primeiro disco do Djavan, pra mim, que você precisa ouvir centenas de vezes pra começar a sacar o quão importante ele é pra Música Popular Brasileira. Pra música mundial até, porque ele influenciou muita gente. Tem Neil Young, tem muita gente, bicho. Tem música minha que tem influência do Neil Young, então dá pra dizer que ele é muito importante. As bandas com as quais eu toquei nos Estados Unidos me influenciam. Eu tava ouvindo Alabama Shakes vindo pra cá e o hip hop hoje em dia tá dialogando muito comigo, principalmente o Kendrick Lamar. Eu acho ele muito, muito foda. Gosto do Kanye West pra caralho.

MBV: Além dos artistas, o que mais te influencia? Pra compor principalmente.

M: Sentimentos e situações. Lembrar de situações… Tem uma música minha que vai sair em breve, que se chama Argumentos e é uma música sobre uma viagem que eu fiz no ano passado, uma road trip com uns amigos. É um sonho de vida que a gente conseguiu concretizar. Peguei uma boa parte da minha poupança e gastei. E me rendeu uma música. Eu espero que a galera curta. A gente saiu do Colorado, nos Estados Unidos, e fez um arco até a Califórnia. Nós passamos por vários estados americanos de motorhome. E a gente fez a música junto. Geralmente, então, são sentimentos provocados por situações, lugares e pessoas. Eu tenho muitas letras que eu nunca musiquei, muita coisa. E tem várias vezes que eu tô dirigindo, aí eu tô ouvindo uma música de alguém que eu gosto muito e às vezes alguma linha melódica me toca de uma maneira, eu paro a música e meio que começo a criar uma outra melodia por cima daquilo, com outro ritmo e tal. Eu tenho o maior medo de copiar os outros, né? Tem várias vezes que você copia sem nem reparar. As letras são reflexões de situações e as melodias surgem… Não sei muito bem explicar como. E tem muita coisa que é transpiração, né? Do tipo: eu preciso entender o que que essa canção é. E aí eu sento lá no meu quarto e tal. É um negócio que eu tô aprendendo ainda. Eu sou muito indisciplinado, mas eu tô conseguindo achar um jeito de criar uma disciplina que respeite também os meus limites de criatividade. 

MBV: É, foi até o Tom Jobim que falou que música é 5% inspiração e 95% transpiração, né? 

M: É isso aí, é isso aí. E quem fala que não é tá querendo se colocar num patamar diferente do seu. Não acredite nessa pessoa. Djavan é um cara que fala isso também. E são caras geniais que fizeram a diferença no planeta, musicalmente falando. E eles tiveram a hombridade e a humildade de deixar isso muito claro. Eu acredito que a inspiração é, de certa forma, uma recompensa do seu subconsciente pro seu esforço. Não só do seu esforço porque você tá sentado e fazendo, mas às vezes você tá passando por uma situação complicadérrima na sua vida, aquilo parece que vai minando a confiança em você mesmo e a inspiração vem e fala: ‘cara, você se esforçou muito pra não cair na vala nesse últimos meses e você tá recebendo essa inspiração aqui de presente’. Não é só um esforço musical, é um esforço na vida de maneira geral, mas o seu principal esforço é com o instrumento ali. 

 

Caetano Veloso é o convidado do novo episódio da série ‘Essenciais’, podcast da Deezer

A plataforma de streaming musical Deezer lançou no mês de julho o nono episódio da série ‘Essenciais’, com Caetano Veloso. O podcast já reuniu grandes nomes da música brasileira em um bate papo informal, tendo a discografia do artista como fio condutor.

Caetano é leonino – como gosta de salientar – e dispensa apresentações. Onipresente na música e na cultura nacional contemporânea, o cantor e compositor ousadamente foi atravessando barreiras que o tempo mal conseguiu lhe impor e segue atento e forte; e crítico. É isso que mostra ao falar sobre a ditadura, por exemplo, no Essenciais, podcast da Deezer que homenageia músicos brasileiros por meio de conversas que usam a discografia do artista como fio condutor.

“Se onde queres revólver sou coqueiro”, como diz na letra de “Quereres”, de 1984, ano de Diretas Já, Caetano foi e é publicamente contra um querer político que violente seus princípios, o que lhe fez preso, exilado e ter capas de discos censuradas. No podcast, ele avalia o peso da ditadura não só na sua obra, mas como um “carma” que ameaça a grandeza do país.

“Será que o Brasil tem que pagar tanto carma assim para chegar a dizer o que ele realmente tem a dizer? Se as reações são tão profundas às possibilidades do Brasil é por causa da inevitável grandeza que o país tem que representar no mundo. O Brasil tem originalidade, é um país de dimensões imensas. A gente fala português nas Américas. Tem uma população altamente miscigenada. É muita coisa. Sabem por que fazem tudo para não dar certo? Porque se der certo é muito! Então a reação é muita. E a reação tem sido muita, mas a gente aguenta. Eu vou em frente”, afirma o artista.

CAETANO COMENTA SOBRE MEME

O disco Muito, de 1978, foi o menos vendido e recebeu uma chuva de críticas negativas. Uma delas, do jornalista Geraldo Mayrink, da revista Veja, muitos anos depois se tornou um meme. É aquele em que aparece Caetano dizendo: “ Você é burro cara, que loucura como você é burro.”

O contexto, segundo Caetano, foi o seguinte: “Ele tinha feito um negócio dizendo que a minha capacidade de escrever os versos das letras das canções tinha caído muito. E dava exemplos de como estava escrevendo mal com trechos das canções. E todos não eram meus, eram citações! E aí pensei o cara tá por fora, o cara é crítico de música e não sabe das coisas”, explica. “Muito” é o disco que traz algumas de suas canções mais populares como “Terra” e “Sampa”.

E pensar que poderíamos ter ficado com uma história musical abreviada de Caetano. No período do Tropicalismo ele considerou deixar a música. Quando criança pensava em ser filósofo, depois professor e artista plástico, porque gostava de pintar.

“A música apareceu, foi uma causalidade. No período do Tropicalismo decidi que ia deixar de fazer música. Tinha uns amigos místicos que diziam que era uma missão, que seria uma coisa grande. Eu não me guio por isso. Eu me reencontro com isso. Quando eu falei do Brasil ter uma vocação, uma possibilidade de grandeza, eu sinto isso.”

 

Ouça o podcast Essenciais da Deezer:

https://www.deezer.com/br/show/57055

Ouça a playlist:

https://www.deezer.com/br/playlist/6234385664

 

Da Redação

OUÇA: João Gabriel lança single “Pó da Manhã”

Estreando no cenário, o cantor e compositor João Gabriel lança o single “Pó da Manhã” que traz uma renovação importante para a Música Popular Brasileira. Através da linguagem metafórica, a canção coloca em pauta a construção histórica da manipulação em massa, onde as dificuldades e hábitos sociais se dão através da já propositalmente arquitetada defasagem de realidades entre as classes da população brasileira.

A inserção eletrônica, aliada ao quinteto de cordas e ao violão e à voz de João, demonstra o ar contemporâneo diante do aspecto orgânico sonoro. A canção faz parte do EP “Múltiplas Cores, com quatro faixas, que será lançado ainda na primeira quinzena julho.

Ouça o single “Pó da Manhã”: